terça-feira, 23 de março de 2010

Processos de Tentação

Gênesis 3:6 Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu e deu também ao marido, e ele comeu.
Três processos podem ser destacados. Primeiramente Eva viu que a árvore era tov para se comer. O texto hebraico usa a mesma palavra que Deus disse a respeito da Sua criação terminada, Eva parece começar aceitando aquilo que o próprio Deus já havia falado sobre aquela árvore: - ora, se o próprio Deus disse que ela é tov, então para mim ela deve ser tov também. Eva inicia o processo da tentação usando o próprio Deus como desculpa, mas suas intenções, como veremos a seguir, já se iniciara para o mal, e o desejo já lhe estava a porta. A serpente já havia envenenado a cabeça de Eva, e a concupiscência (guardem esta palavra) estava sendo parida. O outro processo observado no texto é que além de boa a árvore lhe pareceu “agradável aos olhos”. Em hebraico a palavra dá uma ideia de “apetite”, Eva começou a salivar ao ver o fruto, o desejo dela era de saciar seu apetite, a árvore era então apetitosa. O pecado não parecia mais uma coisa tão ruim assim, pois estava lhe causando desejos. - Ora, uma coisa tão apetitosa assim, não deve ter mal algum. Talvez dissesse Eva. A argumentação da serpente já havia conquistado o coração da mulher. O último processo é o do desejo irresistível. A árvore era “desejável para dar entendimento”. A palavra desejável wenehmad é um verbo na voz reflexiva, o que nos mostra que a árvore já exercia uma ação contra Eva e Eva contra a árvore: A árvore dava desejo a Eva e Eva desejava a árvore. Eva desejou conhecer as coisas a parte de Deus, sua boca já estava cheia de saliva de tanto apetite, e via o quanto era boa. Uma coisa ainda nos trará luz sobre o texto da tentação de Eva, alguns versículos antes o autor do livro havia mencionado a criação de Deus e quando Deus criou as árvores ele diz:
Gênesis 2:9 Do solo fez o SENHOR Deus brotar toda sorte de árvores agradáveis à vista e boas para alimento; e também a árvore da vida no meio do jardim e a árvore do conhecimento do bem e do mal.
Interessante notar que são as mesmas palavras da tentação de Eva. Deus criou as árvores não apenas boas para saciar a fome e para sustentar a vida, mas agradáveis de olhar. Quantas cores, quanta beleza há nas árvores e nos frutos da criação de Deus, uma grande variação de cores e sabores para o prazer do homem (lembrem do que significa Éden). Deste jeito é muito provável que a árvore do conhecimento do bem e do mal fosse realmente frondosa e bela, com cores vivas que chamavam a atenção. No entanto, notamos que Eva teve um desejo além daqueles citados no capítulo 2, Eva desejou para conhecimento. Observe que ela começa desejando segundo a árvore fora criada, e depois subverte o desejo para algo além do que Deus havia dito. Nossas tentações não costumam ser assim?! Desejamos fazer alguma coisa que aquilo não foi destinado na criação para ser feito. O desejo pecaminoso se inicia neste aspecto.
O apóstolo João escrevendo sua primeira carta, faz um alerta sobre o que se passa no coração do homem na tentação. Ele diz:
I João 2:15-16  Não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo.
O termo concupiscência em grego é epithumía, um desejo muito grande por aquilo que é proibido. “concupiscência significa desejo, vontade, cobiça, uma palavra sempre usada na Bíblia com conotação negativa, especialmente quando se refere à ‘carne’, que João emprega aqui no sentido de natureza pecaminosa e corrompida do homem.”[1] Fazendo um paralelo com o que aconteceu com Eva, com as devidas proporções já que inicialmente Eva não tinha a natureza pecaminosa, que o desejo de se alimentar, ou alimentar a carne é a concupiscência da carne, a vontade de satisfazer o que o corpo está pedindo. A concupiscência dos olhos é o apetite, numa linguagem mais moderna seria o chamado “comer com os olhos”. E por fim, a soberba da vida, é o desejo da autonomia em relação a Deus, de ter conhecimento a parte da palavra de Deus, é se achar o seu próprio Deus. Desta feita, toda vez que o homem peca ele tem estes três desejos que já em si são pecaminosos: Satisfazer o desejo carnal, alimentar este desejo dos olhos, como que já estivesse praticando o pecado com a mente, e por fim o ato em si dizendo a Deus que está livre dEle e pode ter suas decisões a parte dEle. O Irmão de Jesus, Tiago, também comenta sobre a cobiça do homem e usa a mesma palavra que João havia usado:
Tiago 1:13-15  Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta.  Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz.  Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.
Esta é a clássica analogia de Tiago para como o pecado nasce no coração de cada pessoa. Primeiro ele deixa claro que a tentação não vem de Deus, mas do próprio homem, esta reside na cobiça (aquela palavrinha falada anteriormente como concupiscência). Tiago explica as coisas desta maneira: “Um Garoto está caminhando e uma garota linda surge em sua frente (um doce pra quem adivinhar o nome dela), então a beleza dela encanta o garoto o atraindo e o seduzindo, na verdade mais do que a beleza, a garota deixa claro que ela esta desejando o garoto. As coisas não terminam ai, e ele corre para os braços dela e ambos tem uma noite bem acordados fazendo coisas das quais nós já sabemos. Para a surpresa do garoto ela engravida, e 9 meses depois surge com o filho, e agora o mais impressionante acontece: o filho do garoto mata ele!” Esta história parece estranha não? Mas você conhece perfeitamente, pois ela acontece diariamente com cada um de nós. Tiago afirma que cada um de nós é tentado pela linda garota chamada cobiça (já tinha adivinhado?), e nós temos um filho chamado pecado e é ele mesmo quem nos mata. Assim mesmo acontece conosco ao pecarmos, provocamos a nossa morte (o afastamento da presença de Deus), nossa própria cobiça, algo que nos é tão natural, provoca a nossa própria ruína. Ao contrário do que normalmente se fala, as coisas que são naturais ou até mesmo as que são vindas no nascimento nem sempre são boas ou corretas. Nossos desejos são errados e pecaminosos desde o dia que nossos primeiros pais pecaram contra Deus. Cada um de nós é chamado a negar-se a si mesmo, lutando contra aquilo que parece tão natural, mas que nada mais é do que desobediência a Deus.
Mateus 16:24  Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me.


[1] LOPES, Augustus Nicodemus. Interpretando o Novo Testamento: Primeira Carta de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. Pág. 69. 

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