
Leibniz parece receber uma forte influência do jesuíta Luiz Molina (1535-1600), ele defendia o que posteriormente foi chamado de molinismo, que compreende a onisciência e os decretos de Deus da seguinte maneira: Há três tipos de “conhecimento”, o natural, o médio e o livre. O conhecimento natural diz respeito as possibilidades ou os diversos mundos possíveis para uma determinada coisa acontecer. O conhecimento médio diz respeito aos mundos factíveis, que são as proposições que permanecem verdadeiras mesmo diante de se opor os mundos possíveis com os seus contrafactuais. São os mundos em que não há uma contradição com outros mundos. Por exemplo: Existe um mundo possível onde Ronaldo não consegue entregar o trabalho do professor Érico na quarta-feira nas mesmas condições que se encontra agora, no entanto, este mundo não é factível (eu espero), diante do fato que nas condições que se encontra, ele vai entregar. Por fim, há o conhecimento livre que é o conhecimento do mundo real. Deus é conhecedor de todos estes conhecimentos, e assim, faz os seus decretos (necessidade), baseado inicialmente no conhecimento natural, depois no conhecimento médio e, por fim, no conhecimento livre, e no conhecimento do próprio decreto, Deus tem presciência de tudo o que acontecerá. Em outras palavras, Deus decreta criar certas criaturas livres em certas circunstâncias e, assim, baseado em seu conhecimento médio e no conhecimento do próprio decreto, Ele torna necessário tudo o que acontece. A harmonia geral de Leibniz se assemelha muito ao molinismo. Para Leibniz mesmo que haja mal no mundo, a criação não é má. Porque o todo é maior que a parte, e a bondade é infinitamente melhor que a maldade. Assim, Deus resolveu criar livremente um mundo em que há o mal, porque diante do conhecimento médio que tem era o mais racional a ser feito e, portanto, era moral e melhor.
É importante explicar o conceito de liberdade em Leibniz, pois pode parecer que por Deus ser essencialmente racional, não haveria liberdade alguma nEle por agir racionalmente. No entanto, Leibniz diz:
É antes a verdadeira liberdade, e a mais perfeita, poder usar o melhor de seu franco arbítrio, e de exercer sempre esse poder, sem ser desviado, nem por força externa, nem por paixões internas, cujas fazem dos corpos escravos. Não há nada mais servil do que ser sempre levado ao bem, e sempre por sua própria inclinação, sem nenhuma empecilho, e sem algum desagrado. E de fazer a objeção que Deus precisava então de coisas externas, isso não passa de um sofismo. Ele as criou livremente: mas tendo se proposto um fim, que é o se exercer sua bondade, a sabedoria o determinou a escolher os meios mais próprios para se obter esse fim. Chamar isso necessidade, é tomar o termo num sentido não ordinário que o priva de toda imperfeição, um pouco como se faz quando se fala da cólera de Deus[1].
Desta feita, para Leibniz, agir livremente é agir moralmente, levado ao bem, ao melhor, e isto só pode ocorrer mediante a razão. Portanto, Deus ao agir racionalmente age livremente e moralmente. E por ser o homem, racional, cabe também a este agir de maneira livre e moral, buscando sempre o bem maior. Pois é da essência do homem ser racional, e assim, ser também moral. Destarte, o homem é livre quando age mediante a razão, quando age de acordo com sua essência, e peca todo aquele que age de outra maneira. O homem é livre mesmo diante da necessidade dos decretos de Deus, porque a necessidade hipotética leva em consideração a vontade do indivíduo. Deus sabe tudo o que o homem vai fazer em determinadas situações num certo contexto, e este homem, é livre se fizer aquilo que Deus deseja que ele faça, o bem, e será um escravo se obedecer as suas paixões internas e fizer algo mal. Mas se Deus não quer que o homem faça o mal, e tem poder para impedir, por que não impede? Leibniz responde que impedir que o homem faça um mal, é cometer um mal maior ainda, e no caso de Deus, ser irracional, o que Lhe é impossível. Pois, o mal cometido levará a um bem maior e, portanto, é mais racional permitir este mal do que impedi-lo. Leibniz também faz uma distinção entre as vontades de Deus, de maneira antecedente, Deus não quer que ninguém peque, todavia de maneira consequente ele permite o pecado. Isto porque, este pecado da vontade consequente leva a um bem maior e, portanto, é mais racional, e como Deus não pode agir de maneira irracional, ele permite que se peque, contudo, penaliza pelo pecado cometido, pois a criatura por sua vontade agiu assim.
Para conclusão, observa-se que a liberdade e a necessidade em Leibniz estão intimamente ligadas com o agir moral e racional. De maneira tal, que agir livremente é agir moralmente ou racionalmente. E mesmo que os acontecimentos sejam necessários por conta da onisciência de Deus, a teoria da necessidade hipotética, que leva em consideração a vontade, não retira a culpa da criatura mediante um ato de maldade, ao contrário, dá-lhe a culpa necessária para a pena que lhe é imposta por Deus, a saber, inferno.
[1] LEIBNIZ, G.W. Ensaios de Teodicéia. Trad. Louise Walmsley, 2009. Texto usado exclusivamente para aula de Teoria do Conhecimento II. Pág. 7.
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